sábado, 3 de maio de 2014

Seus olhos (Gonçalves Dias)


Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir,
Estrelas incertas, que as águas dormentes
Do mar vão ferir;


Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Têm meiga expressão,
Mais doce que a brisa, — mais doce que o nauta
De noite cantando, — mais doce que a flauta
Quebrando a solidão,


Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir,
São meigos infantes, gentis, engraçados
Brincando a sorrir.


São meigos infantes, brincando, saltando
Em jogo infantil,
Inquietos, travessos; — causando tormento,
Com beijos nos pagam a dor de um momento,
Com modo gentil.


Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Assim é que são;
Às vezes luzindo, serenos, tranquilos, 
Às vezes vulcão!


Às vezes, oh! sim, derramam tão fraco,
Tão frouxo brilhar,
Que a mim me parece que o ar lhes falece,
E os olhos tão meigos, que o pranto umedece
Me fazem chorar.


Assim lindo infante, que dorme tranquilo,
Desperta a chorar;
E mudo e sisudo, cismando mil coisas, 
Não pensa — a pensar.


Nas almas tão puras da virgem, do infante, 
Às vezes do céu
Cai doce harmonia duma harpa celeste,
Um vago desejo; e a mente se veste
De pranto co'um véu.


Quer sejam saudades, quer sejam desejos
Da Pátria melhor;
Eu amo seus olhos que choram em causa 
Um pranto sem dor.


Eu amo seus olhos tão negros, tão puros,
De vivo fulgor;
Seus olhos que exprimem tão doce harmonia, 
Que falam de amores com tanta poesia,
Com tanto pudor.


Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Assim é que são;
Eu amo esses olhos que falam de amores 
Com tanta paixão.

(Poesia: Gonçalves Dias - Foto: Eliza Ribeiro - Taperoá - PB) 

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