sábado, 12 de outubro de 2013

A imortalidade da alma (Cícero)

O que se pode mesmo afirmar, com certeza, é que, para Públio Cipião, dentre os muitos dias de existência bela e alegre, a jornada mais brilhante foi aquela em que, já ao anoitecer, deixando o Senado, fora conduzido à sua residência pelos senadores, circundado pelo povo romano, pelos aliados e pelos latinos, na véspera de deixar esta vida. Aquilo foi como que transitar do mais elevado grau de dignidade para junto dos deuses, em vez de descer aos infernos.

Realmente, eu não poderia aderir àqueles que, de recente, puseram-se a proclamar que a alma perece junto com o corpo e que tudo fica desfeito pela morte. 

Para mim, vale mais a autoridade dos antigos e de nossos antepassados que aos mortos conferem direitos sacros. Ora, isso, por certo, não teriam feito se julgassem que nada mais lhes traria algum proveito.

O mesmo pensavam aqueles que, outrora, povoavam este solo. Bem eles que promoveram a Magna Grécia, hoje, arruinada, mas então, florescente, mediante os institutos e preceitos por eles transmitidos. 

Também apelo para a autoridade daquele que o oráculo de Apolo tinha julgado como "o mais sábio". Não um sábio que, ora afirma uma coisa, ora nega, como, aliás, é encontradiço, mas, sempre, afirma que as almas dos seres humanos são divinas e, quando deixam o corpo, caminham de retorno para o céu, onde os melhores e os mais justos são, de imediato, transferidos.

Idêntico era o modo de ver de Cipião. Como se tivesse pressentido, poucos dias antes de morrer, estando então presentes Filo e Manílio com outros mais, entre eles tu também, Cévola, pois tinhas ido comigo, ele dissertou acerca da República, ao longo de três dias. O final da explanação quase tudo versou sobre a imortalidade da alma. Dizia que, durante um sono, ouvira isso graças a uma visão, da boca de Africano. 

Se é mesmo verdade que, no momento da morte, a alma dos melhores escapa como que fugindo da prisão e dos grilhões do corpo, a quem concederíamos voo mais rápido para os deuses do que Cipião? Receio que lamentar aquela perda seria mais inveja do que amizade.

Se, ao contrário, valer a outra assertiva de modo que aniquilam-se a alma e o corpo, sendo que nada resta da vida, então também nada subsiste nem de bom nem de mau após a morte. Perdido que forem os sentidos, a gente fica reduzido ao estado de não nascido. 

No entanto, se alguém nasceu foi bem ele com o qual nos felicitamos, enquanto esta cidade, ao longo de sua história, também se alegra com o mesmo. 

(Texto: Cícero - Obra: A amizade - cap. III - 1: A imortalidade da alma - Foto: Eliza Ribeiro - Taperoá (PB)     

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