quarta-feira, 16 de abril de 2014

Acordo de noite (Fernando Pessoa - Alberto Caeiro)


Acordo de noite subitamente, 
E o meu relógio ocupa a noite toda. 
Não sinto a Natureza lá fora. 
O meu quarto é uma cousa escura com paredes vagamente brancas. 
Lá fora há um sossego como se nada existisse. 
Só o relógio prossegue o seu ruído. 
E esta pequena cousa de engrenagens que está em cima da minha mesa 
Abafa toda a existência da Terra e do céu... 
Quase que me perco a pensar o que isto significa, 
Mas estaco, e sinto-me sorrir na noite com os cantos da boca, 
Porque a única cousa que o meu relógio simboliza ou significa 
Enchendo com a sua pequenez a noite enorme 
É a curiosa sensação de encher a noite enorme 
Com a sua pequenez... 

(Poesia: Fernando Pessoa - Alberto Caeiro - Foto: Eliza Ribeiro - Taperoá - PB)

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