terça-feira, 20 de maio de 2014

Uma certa arte (Elizabeth Bishop)


A arte da perda é fácil de estudar:
A perda, a tantas coisas, é latente
Que perdê-las nem chega a ser azar.

Perde algo a cada dia. Deixa estar:
Percam-se a chave, o tempo inutilmente.
A arte da perda é fácil de abarcar.

Perde-se mais e melhor. Nome ou lugar,
Destino que talvez tinhas em mente
Para a viagem. Nem isto é mesmo azar.

Perdi o relógio de mamãe. E um lar
Dos três que tive, o (quase) mais recente.
A arte da perda é fácil de apurar.

Duas cidades lindas. Mais: um par
De rios, uns reinos meus, um continente.
Perdi-os, mas não foi um grande azar.

Mesmo perder-te (a voz jocosa, um ar
Que eu amo), isso tampouco me desmente.
A arte da perda é fácil, apesar
De parecer (Anota!) um grande azar.

(Poesia: Elizabeth Bishop - Foto: Bete Diniz - Taperoá - PB)
(Do livro ASCHER, Nelson. Poesia alheia. 124 poemas traduzidos. Rio de Janeiro: Imago, 1998.)

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